Alvo durante décadas das mais variadas agressões, os manguezais em torno do lixão de Gramacho estão experimentando uma nova vida graças a um projeto de recuperação liderado pelo biólogo Mário Moscatelli. Criado nos anos 70 em um terreno de 1,3 milhão de metros quadrados às margens da Baía de Guanabara, no município de Duque de Caxias, o Aterro Sanitário de Jardim Gramacho recebeu ao longo dos anos mais de 50 milhões de toneladas de lixo produzidas pelos habitantes da Região Metropolitana do Rio. Até o início dos anos 90, no entanto, não havia nenhum tipo de tratamento dos resíduos lá depositados ou gerenciamento ambiental da região, conta Moscatelli:
– Encontrei os manguezais bastante degradados após décadas de descuido.
Iniciado em 1997, o projeto de recuperação gerencia cerca de 130 hectares de mangues na região, dos quais 40 hectares foram replantados nos últimos anos. No início, o principal problema vinha do chamado chorume, um líquido escuro, poluente e fétido resultado da decomposição do lixo, lembra o biólogo:
– O chorume invadia os manguezais e matava tudo. Devido às alterações químicas que gera nos sedimentos, ele afeta diretamente a capacidade das plantas de absorverem nutrientes. Resumindo, onde o chorume bate não sobra nada.
O problema só começou a ser contornado em 2000, quando foi inaugurada uma estação de tratamento do chorume de Gramacho. Desde então, as principais agressões vêm dos resíduos jogados diretamente na baía ou trazidos pelos rios em volta do lixão: Sarapuí, Iguaçu e São João de Meriti. Segundo Moscatelli, em apenas 50 metros quadrados de mangues sua equipe, que conta em média com 30 homens, já retirou 1,5 tonelada de lixo.
– Esses rios são verdadeiros valões de esgoto e lixo – avalia. – São colchões, sofás, TVs, geladeiras, sacos e garrafas plásticas, animais mortos, tudo o que se pode imaginar. Esse resíduos, além de danificarem mecanicamente as plantas, impermeabilizam a lama e inviabilizam a recuperação dos manguezais.
De acordo com o biólogo, as ecobarreiras implantadas nos rios em torno da baía para tentar conter o lixo são muito frágeis e não cumprem sua função.
– O que temos não são ecobarreiras, mas ecopeneiras. As estruturas são muito ruins e arrebentam com qualquer chuva – reclama. – É preciso conter esse lixo antes que chegue à Baía de Guanabara, porque depois o custo para retirar se multiplica por cem.
Ainda assim, Moscatelli se diz impressionado com a recuperação dos manguezais de Gramacho. Segundo ele, mudas plantadas em 2002 da espécie mangue vermelho, a de mais lento crescimento, já atingiram seis metros de altura.
– Os manguezais têm uma grande capacidade de resposta – conta. – Se neutralizarmos os fatores de agressão, eles se desenvolvem muito e depressa. Digo que o mangue tem um coração de mãe, sempre perdoa.
Para Moscatelli, a recuperação e preservação dos manguezais da baía são importantes tanto do ponto de vista ambiental quanto socioeconômico. De um lado, eles aumentam a biodiversidade e funcionam como esponjas, ajudando a filtrar da água vários elementos contaminantes. Do outro, a biodiversidade maior incrementa a atividade pesqueira e pode servir como atrativo para o ecoturismo.
– Temos condições de reverter todo esse passivo ambiental nos próximos cinco anos e chegar a 2016 com uma baía limpa e linda. Não é falta de dinheiro, mas de seriedade, e não podemos deixar escapar essa oportunidade – pede.
Fonte: O Globo